quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Proficiências e a Oldschool.


Vários jogadores do chamado movimento Oldschool, ou, em outros termos, da OSR (Oldschool Renaissance), tem e propagam uma certa aversão às regras de habilidades ou proficiências. Seja em sua encarnação mais complexa, materializada nas nonweapon proficiencies da Segunda Edição do ADnD, seja em sua encarnação mais simples, com os secondary skills também da Segunda Edição, seja ainda em sua versão simplória, dos skills da Quarta Edição, as regras de proficiências são rejeitadas por boa parte dos jogadores vinculados aos primórdios do ADnD.
O argumento central por eles apresentados é simples, elegante, e relativamente forte: todo personagem deve ser capaz de tentar, e ter uma chance, de realizar qualquer feito ou ato que deseje; a existência de proficiências limita esse aspecto do jogo, pré-definindo exatamente o quê cada personagem sabe fazer ou não. Desse modo, as proficiências terminariam por empobrecer a experiência geral de jogo, e, eventualmente, a diminuir as possibilidades heróicas e aventurescas de cada personagem.  

A ausência de proficiências, a meu ver, cria de imediato um grave problema. Como julgar a tentativa de realizar atos e feitos altamente especializados, que poucas pessoas dominam? Por exemplo, se não existe um sistema de proficiências, qualquer jogador teria o direito de tentar construir um castelo ou um barco, de tentar curar uma doença, de tentar descobrir a penicilina, etc. Esse problema será abordado mais a frente. Continuemos com as críticas da OSR.

Um segundo argumento, ligado ao primeiro, mas diretamente relacionado ao design das últimas edições dos RPGs clássicos se relaciona à idéia de que os jogadores devem "jogar" seus personagens, e não "jogar" suas fichas. A existência de proficiências e habilidades diversas inclinaria os jogadores a se preocupar mais com seus poderes e conhecimentos do quê com a personalidade mesmo de seus personagens.

Esse segundo argumento não é verdadeiramente importante, porque a forma de jogo criticada depende muito mais dos jogadores do que do sistema de jogo em si. Não é a existência de proficiências, habilidades e poderes que leva os jogadores a se preocupar mais com as estatísticas de suas fichas do que com a interpretação de seus personagens - mas sim, como já debatido anteriormente, uma falta de inclinação para o estilo de jogo que os RPG evocam. Nessa hipótese, tais jogadores estão utilizando o RPG como se War Game fosse. Conquanto os sistemas repletos de poderes habilidades atraiam esse tipo de jogador, e, talvez, até mesmo estimulem esse estilo de jogo, não se pode atribuir às suas regras, apenas, a culpa pelo problema.

Jogadores mais preocupados com a interpretação de seus personagens usualmente fugirão de sistemas desse gênero - justamente porquê a quantidade excessiva de itens a serem relacionados em suas fichas termina por lhes atrapalhar o jogo e a interpretação. O argumento, entretanto, valeria também tão somente em relação a sistemas extremamente entupidos de habilidades, poderes e proficiências, como por exemplo as duas últimas edições de DnD, e, talvez, algumas formas de se jogar GURPS. Ademais, é importante fazer uma distinção entre proficências e powers and feats. Esse primeiro argumento tem muito mais validade em relação a esses dois últimos mecanismos de jogo do que às proficiências encaradas solitariamente.  

O primeiro argumento, de toda forma, permanece verdadeiramente forte como criítica aos sistemas de proficiências. Eu, em particular, gosto das proficiências, e costumo utilizá-las sempre em meus jogos. Há, entretanto, uma forma de se encarar a existências das proficiências que elimina por completo a crítica apresentada. Basta encarar as proficiências de um personagem não como o conjunto fechado de coisas que ele conhece e sabe fazer, mas sim como o conjunto de coisas que ele com certeza conhece e sabe fazer.

Ou seja: as proficiências não seriam tudo que um personagem sabe, mas sim aquilo que sem nenhuma sombra de dúvida ele sabe. Nesse caso, desaparece o argumento de que as proficiências limitariam os personagens, porque eles continuariam podendo tentar realizar qualquer outro feito ou ato que porventura não estivesse listado entre suas proficiências. Evidentemente, as chances de ser bem sucedido em um teste de uma proficiência devem ser maiores do que as de ser bem sucedido em um teste em que se tenta algo que não se conhece.

Em tal panorama, duas grandes vantagens emergem para a utilização de um sistema de proficiências: 1- o conjunto de proficiências certamente conhecidas auxilia a definir a personalidade e a estória de vida do personagem, auxiliando, ao invés de atrapalhar, a interpretação; 2- passa a existir uma regra clara em relação a conhecimentos altamente especializados, citados anteriormente.

Existem vários outros argumentos a favor de um sistema de proficiências, mas parece-me que a mudança de foco em relação ao que significam as proficiências, e como elas se comportam em jogo, resolve o problema e responde satisfatoriamente à crítica de parte da OSR às proficiências.
 


terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

As Crônicas de Tallyar - #8.

* Referência: As Crônicas de Tallyar - #7.


As Casas de Nobreza do Reino de Tallyar




AS CASAS MAIORES

1. Clã do Escudo Partido:
Raça: Anões.
Título: Earl.
Domínios: Ballia e as Escarpas Tyrrias, acima do Bronéas.

2. Elsfonor:
Raça: Elfos.
Título: Príncipe.
Domínios: Quelfas e a parte norte da Floresta Alta.

3. Losrhian:
Raça: Elfos.
Título: Cavaleiro.
Domínios: Yallian e a parte sul da Floresta Alta, até o lago e o rio Bronéas.

4. Strenski:
Raça: Bárbaros.
Título: Arquiduque.
Domínios: Castelo Strensk e arredores ao norte.

5. Walchow:
Raça: Bárbaros.
Título: Conde.
Domínios: Cidadela de Walchia e arredores ao sul.

6. Hajna:
Raça: Humanos.
Título: Arquiduque.
Domínios: Terras ao Redor de Dénes, abaixo de Yaltha até as Escarpas Tyrrias – atuais administradores de Dénes.

7. Vinge:
Raça: Humanos.
Título: Arquiduque.
Domínios: Terras ao Redor de Vili – atuais administradores de Vili.


AS CASAS MENORES


1. Ildiko – Barão – Terras ao redor do Lago Arthol.

2. Virag – Conde – Terras ao redor de Kalman.

3. Sári – Conde – Terras ao Redor de Gaszi.

4. Piri – Barão –Terras na Fronteira com o Rio Crynes.

5. Almos – Barão – Terras nas Florestas ao norte de Ballia.

6. Laci – Conde – Terras nas Planícies do Leste.

7. Levi – Marquês – Marca entre o Lago Porthus e a Floresta Alta.




AS CASAS PROSCRITAS


1. Todor – Cavaleiro – Castelo fincado nas Escarpas Tyrrias.

2. Robi – Cavaleiro - Castelo em Vila na fronteira com a Floresta ao norte de Ballia.

3. Pisti – Capelão – Igrejas no Sul.

4. Odon – Cavaleiro - Castelo e propriedades em Dénes.

5. Otto – Cavaleiro – Exílio em propriedades em Gaszi.

6. Nandor – General – Propriedades em Kalman.

7. Moric – Cavaleiro – Castelo ao norte de Dénes.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Algumas reflexões paralelas: Parte III.

* Referência: Algumas reflexões paralelas: Parte II.

No artigo anterior foram discutidos os MMORPG. Permaneceremos nesse assunto hoje também. Há alguma esperança para os MMORPG se aproximarem do RPG? E, isso é possível, ou mesmo desejável?

O primeiro MMORPG comercial que joguei foi o World of Warcraft. No começo, foi maravilhoso. Creio que levei um personagem até o 40º nível, e outro ao 25º. E nunca mais tive vontade para jogá-lo. Joguei ainda City of Heroes por dois dias, Guild Wars por três dias, Archlord por uns dois meses, e Warhammer Online por uns dois dias. Era simplesmente chato jogá-los: qualquer um deles, até mesmo porquê eram idênticos.
    
Meus momentos favoritos eram quando não havia ninguém perto – ou seja, quando o jogo deixava de ser um MMORPG. Eu deveria estar jogando Nethack, ou Diablo.
    
Antes de jogar o World of Warcraft, havia jogado por um tempo um pequeno MMORPG gratuito, no estilão Zelda, chamado Vasquaria. Creio que menos de duzentos jogadores compartilhavam o mundo. Havia um grupo de administradores que tentavam bravamente construir uma estória para o ambiente – e, aos trancos e barrancos, conseguiam. Nos três meses que joguei, vi mais estória elaborada pelos próprios jogadores do quê em qualquer MMORPG comercial com o qual tenha tido contato - e, ainda assim, não era nada de qualidade realmente superior. Mas, de todo modo, bem melhor.
    
Minha tese é de que um MMORPG, para se aproximar do RPG, teria que ter menos jogadores. Um máximo de cinqüenta, talvez cem. E mestres, para conduzir a estória e orientar os jogadores sobre o quê esperar, como reagir - não para pré-determinar caminhos e atitudes, claro, mas apenas para servir ao jogo como os mestres de mesa já fazem. Evidentemente, isso me parece comercialmente impossível e inviável, tanto em termos financeiros quanto em relação ao custo de bandwidth para viabilizar a idéia.
    
A tarefa, portanto, ficaria para pequenos projetos gratuitos, que se voltariam para construir jogos de mMORPG (minor multiplayer online RPG) nos quais se desse primazia à construção de uma boa estória, para e com a ajuda dos jogadores envolvidos. Lamentavelmente, porém, os pequenos projetos de MMORPG que existem são profundamente influenciados pelos grandes MMORPG comerciais, e, via de regra, não passam de cópias mais pobres dos resultados obtidos pelas grandes companhias.
    
Não haveria problemas maiores, na existência dos MMORPG, se as coisas ficassem como estão.
    
Mas os MMORPG estão começando a influenciar os RPG tradicionais. Isso é ruim. Isso é péssimo. Isso é muito, mas muito, ruim.
    
E, o pior: os MMORPG conseguiram influenciar o principal RPG que existe.
    
No próximo artigo, discutiremos a influência dos MMORPG sobre a Quarta Edição do Dungeons and Dragons - as vantagens, e as grandes desvantagens de tal influência.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Mapas e RPG - Parte I.

Os mapas e os jogos de RPG estão, desde o princípio do hobby, umbilicalmente interrelacionados, a ponto de que, até os dias de hoje, dificilmente uma aventura de RPG se desenvolve sem a presença de pelo menos alguns mapas básicos. Na medida em que os War Games dependem, todos eles, de mapas que expressem a situação tática do jogo e que permitam a visualização e o desenvolvimento dos combates e das batalhas, os jogos de RPG, fiéis à sua origem, incorporaram de imediato os mapas aos seus livros e suplementos.

Tanto é que, por exemplo, os primeiros mapas do Dungeons and Dragons, e de outros jogos tais como Tunnels and Trolls e Rolemaster, eram todos divididos em hexágonos, seguindo o padrão de segmentação do terreno adotado pela grande maioria dos War Games. Ao contrário dos jogos de guerra, porém, os mapas de RPG não serviam exclusivamente para permitir o desenvolvimento das batalhas. Paralelamente aos mapas de calabouços, labirintos e cenários de combate em geral, os livros de jogo traziam diversos mapas territoriais, que representavam os reinos, países e regiões que as personagens exploravam e habitavam.

Uma das marcas de Greyhawk, o mais clássico dos mundos de Dungeons and Dragons, eram seus belos mapas hexagonais, cultuados até hoje pelos jogadores que tiveram contato com esse material. Segue um exemplo abaixo:



Imagem retirada do blog Greyhawk Grognard


A análise teórica do papel dos mapas nos jogos de RPG perpassa por três eixos distintos,  que estão presentes em qualquer mapa de RPG: a forma de confecção do mapa, ou, quais materiais e recursos foram utilizados para a sua confecção; o estilo de confecção do mapa, ou, a partir da forma de confecção selecionada, quais elementos gráficos foram utilizados para o desenho; e a finalidade do mapa, ou seja, porque o mapa foi feito, tendo em vista uma aventura ou campanha específica. Além disso, é importante ter em mente como esses três eixos se relacionam, e, de certo modo, tornam-se dependentes uns dos outros.

Cada um desses eixos será discutido em um texto próprio. De todo modo, a primeira coisa que um mestre de jogo deve pensar antes de confeccionar um mapa, é se ele realmente é necessário para sua campanha. Conquanto tal pergunta esteja relacionada à finalidade do mapa, é importante fazer uma breve nota sobre ela ainda aqui. A confecção de mapas é trabalhosa e consome bastante tempo. É muito comum que até mesmo mestres experientes terminem perdendo tempo e energia criando e desenhando mapas que terminam tendo um uso apenas marginal no jogo, quiçá uso nenhum. 

Nesse sentido, é conveniente evitar a confecção de mapas que não terão verdadeiro uso para os jogadores. Não é toda taverna ou estalagem que precisa de um layout, nem toda vila necessita de um mapa para se tornar viva aos olhos dos jogadores. Em verdade, nem mesmo a maioria das grandes cidades requer tanto detalhamento. Apenas aqueles locais que realmente terão uma grande importância para a campanha, e que, ademais, precisam estar detalhadas graficamente, é que merecem a confecção de um mapa.

É claro que, bom, se você tiver tempo e estiver mergulhado um um surto de criatividade, vá em frente e mapeie tudo que lhe der vontade. De todo modo, mapeie por prazer - nunca é bom se sentir pressionado a mapear para uma determinada sessão de jogo. Como dito, são poucos os locais e regiões que verdadeiramente dependem de mapas para funcionarem dentro do jogo.

 

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Algumas reflexões paralelas – Parte II.

Conclui-se que os RPG de computador não são RPG de fato. Mas, e os MMORPG? Jogos tais como World of Warcraft, City of Heroes, Everquest, Warhammer Online, são RPG? Sinceramente, eles são menos RPG ainda do que os RPG de computador. Isso porquê o vínculo que eles possuem com o RPG, ou seja, o aspecto teatral vinculado à construção de uma boa estória, é virtualmente inexistente nos MMORPG.

Explico-me. É impossível para a companhia que desenvolve um MMORPG manter o controle sobre a estória do jogo. A Blizzard tenta: faz expansões para o World of Warcraft, avança a estória do cenário, altera as localizações e heróis do jogo. Mas ela controla tão somente a macro-estória do jogo. A micro-estória, aquela que a acontece a cada dia, a cada segundo, lhe escapa completamente. Essa micro-estória pertence aos jogadores.

E ela é uma completa porcaria. Ou melhor, ela simplesmente não existe.

Isso acontece porquê se é difícil fazer quatro pessoas concordarem em construir uma boa estória juntos, conseguir o mesmo feito com a quantidade de pessoas que habitam os MMORPG é totalmente impossível. Se por um lado há a estória feita pela companhia, e a estória consignada nas quests e nas falas dos NPCs, e nos próprios locais do mundo construído eletronicamente, por outro lado há sempre uma quantidade imensa de jogadores construindo péssimas estórias, destruindo as estórias dos outros, ou simplesmente não fazendo absolutamente nada que remotamente lembre uma estória.

Os vínculos dos MMORPG com o aspecto teatral do RPG, portanto, ficam seriamente prejudicados. Sério: como construir uma estória no magnífico mundo de Azeroth quando passa cavalgando ao seu lado o poderoso Warlock Undead conhecido como XXXgamerZZ12764?
   
E onde está graça, para quem gosta de RPG, dos MMORPG? Para alguns, em seu lado War Game, similar ao Rogue e ao Nethack - extremamente bem desenvolvido, sem dúvida alguma. Para outros, na estória que, a despeito de tudo, pode ser extraída das quests e dos NPCs. Para a grande maioria dos jogadores, porém, em motivos que não guardam praticamente nenhuma relação com RPG. De toda forma, acredite-me, essa graça tende a acabar rápido. Em algum tempo, torna-se insuportável.
    
É verdade: no começo, parecerá que o MMORPG é tudo que você sempre sonhou. Você não conseguirá largá-lo. Mas, se seu interesse nele é o mesmo interesse que você tem em jogar RPG, ou seja, se você está tentando substituir o RPG pelo MMORPG, logo essa graça desaparecerá: tais jogos simplesmente não tem vínculo o suficiente com o aspecto teatral do jogo para se sustentarem a longo prazo. Talvez eles ainda tenham graça por conta de seu lado War Game, ou pelos amigos da sua guilda – mas, pode anotar, você logo estará irritado de ter que ler o quê os NPCs dizem, ou de interagir com o mundo fora da parte que lhe interessa.
   
Os MMORPG, assim como os RPG de computador, não são verdadeiros RPG. Por algum motivo, nesse caso, isso me parece demeritório. Não sei explicar. Talvez porquê eles tenham uma falsa aparência muito forte de serem verdadeiros RPG, mas não são. Difícil explicar, realmente.

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

As Crônicas de Tallyar - #6.

* Referência: As Crônicas de Tallyar - #6.

A Restauração e o Reinado de István Bálazs


István dedicou-se, pelos últimos vinte anos, a fortalecer Tallyar. A maior parte dos esforços foi dedicada à construção e fortificação de Yaltha, e à revitalização do Porto de Vili, único acesso ao mar viável do país. Nesse meio tempo, teve uma filha meia-elfa, Bianka, e um filho bastardo, Akós, que tem pretensões de assumir o trono do pai – com o apoio de alguns nobres, que vêem o bastardo humano com melhores olhos do que à elfa.

As casas de Strenski, Hajna e Vinge receberam Arquiducados dentro do Reino, e as demais casas foram novamente alocadas em suas posições originais. Os votos feudais foram refeitos, e as obrigações de auxílio militar e de envio de parentes, reforçadas.

Nesse meio tempo, o Império de Alltenstarch se recompôs. Os Holzsenteins venceram a guerra civil, e derrotaram os invasores, a despeito de perderem alguns territórios, principalmente ao sul. Apesar do golpe, o Império, liderado pelo brutal Friedleich, encontra-se forte e saudável, após os terríveis anos da libertação de Tallyar. E também o Império de Gárrya tornou-se poderoso novamente, e tropas concentram-se na fronteira.

A jovem Bianka está em idade de se casar – e existem pretendentes em praticamente todos os reinos de Prystina. O paradeiro de Akós é desconhecido – as últimas notícias indicam que ele estava em uma expedição de caça com amigos nas Escarpas Tyrrias. O Rei István tem um plano audacioso, mas secreto, ainda, para construir castelos e fortificações pelo país – mas, para o norte, ou para o sul? Ou ambos? O pequeno Reino de Tallyar, experimentando sua ainda recém-conquistada independência, vez mais se encontra imprensado entre dois Impérios gigantes, sanguinolentos e rivais ...

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Algumas reflexões paralelas - Parte I.


A análise da anatomia do termo RPG leva a uma pergunta curiosa: os RPG de computador são verdadeiros RPG? A resposta parece ser, a princípio, não. Não que eles não sejam grandes jogos, pelo contrário: Baldur´s Gate, Dark Sun, Dungeon Master, Eye of the Beholder, Ultima, Phantasy Star, etc., são todos jogos espetaculares. Mas falta-lhes o elemento teatral e interpretativo que compõe a estrutura do RPG – a grande maioria desses jogos oferece ao jogador uma estória fantástica, excelente, mas virtualmente nenhuma possibilidade interpretativa.

Seriam War Games, então? Difícil dizer. Creio que prefiro pensar neles como "adventures" com estatísticas e simulações aleatórias de números, ou, cunhando uma expressão desconhecida, “talegames”. Uma segunda espécie de jogos de RPG de computador são “simples” simulações mecânicas de lutas e combates, seja em uma dungeon, ou em qualquer outro cenário – esses sim, mais próximos dos War Games. Como por exemplo são Rogue, Nethack, Angband e jogos do gênero. Os Diablo seriam possivelmente um misto entre os dois estilos – o primeiro, mais próximo da simulação, o segundo, pendendo igualmente para a simulação e para a “tale”.

Alguns jogos de RPG para computador, entretanto, oferecem sistemas interpretativos básicos, que inclusive alteram o resultado final da estória contada no jogo. Cito, de cabeça, Torments, os Knight of the Old Republic, Jade Empire, e o recente Dragon Age – existem outros, claro. De fato, tais sistemas aproximam o jogo um pouco mais do quê seria um RPG. Ainda assim, não acredito que isso os torne verdadeiros RPG – porque as escolhas interpretativas não são livres: elas continuam pré-determinadas pela programação do jogo, e não podem ser criadas pelo jogador.

Evidentemente, o fato de não poderem ser classificados como RPG não é nenhum demérito para esses jogos, que, como dito, muitas vezes são ótimos. Pensando bem, talvez seja melhor simplesmente abandonar as idéias apresentadas e pensar neles simplesmente como RPG de computador – não são RPG, mas a terminologia serve para identificá-los.

Então, porquê será que muitas vezes os jogadores de RPG amam profundamente os RPG de computador, e se sentem plenamente satisfeitos em jogá-los? A resposta é simples. Em relação a jogos do estilo Rogue e Nethack, porquê War Games também são muito divertidos – e essa espécie de derivação também o é. Os RPG de computador do primeiro gênero, por outro lado, quando são de boa qualidade, trazem algo que é uma das finalidades do RPG, e que, infelizmente, é muito difícil de ser conseguido: uma boa estória, contada de forma agradável e emocionante.

Ou seja, se por um lado os RPG de computador estão desvinculados do aspecto teatral do RPG em relação à questão da interpretação, por outro lado dependem, e muito, da parcela teatral que resulta na construção de uma boa estória. A forma pela qual os RPG criam uma ambientação adequada, com personagens e tramas extremamente bem pensadas e elaboradas, é quase impossível de ser simulada em um RPG normal – isso porque seus criadores tem a possibilidade, e o dever, de manter um rigoroso controle de qualidade sobre a estória produzida, circunstância que facilita a construção de aventuras realmente memoráveis para ser jogadas.

Quase impossível, mas não impossível. Tal tema ainda será discutido, e constitui um dos principais problemas do jogo de RPG.

quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Caricatura - #3.

* Referência: Caricatura - #2.

Essa caricatura parece com algum bicho feio, de orelhas grandes. Não, não, parece com um ... é, com um bicho feio mesmo.



quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Direito e RPG - Parte III.

* Referência: Direito e RPG - Parte II.




A terceira situação jurídica possível decorrente da relação entre o Império Romano e os Reinos Bárbaros que o sucederam é aquela que vigorou após a queda do Império, e a conquista de seus antigos territórios pelos novos Reinos fundados pelos povos bárbaros. Conforme dito inicialmente, surgiu de tal situação um conflito entre o direito invasor, amparado no conceito de “eternalidade” do direito, e o direito imperial antigo, que, apesar de pertencer a um Estado não mais existente, era bem mais complexo que o direito bárbaro, e ainda regia muitas das relações jurídicas que subsistiam no antigo território imperial.

Conquanto o direito bárbaro regulasse os problemas jurídicos que surgiam no interior das sociedades onde ele vigorava, ele não possuía complexidade e detalhamento o suficientes para eficazmente substituir o direito romano nas regiões onde ela havia vigorado por séculos. Por mais que os novos reis pretendessem, talvez, substituir o direito imperial por suas próprias regras, eles não possuíam um arcabouço de leis capaz de realizar, regrar e harmonizar a quantidade de situações e problemas jurídicos que ainda existiam na velha sociedade romana, e que eram ainda adequadamente reguladas pelo direito do Império morto.

Evidentemente, o direito romano que sobreviveu à queda do Império não era mais o refinado arcabouço de legislação e jurisprudência que compunha a cultura jurídica clássica, mas, ainda assim, era bem mais complexo que o simples direito bárbaro. A solução encontrada para o problema, pelos vários reinos bárbaros que se espalharam pela Europa, foi a de lançar mão da idéia de “personalidade” do Direito. Os homens que tinham pai bárbaro estavam submetidos ao direito bárbaro, e os homens que tinham pai de origem romana, estavam submetidos ao antigo direito romano.

Em outros termos, subsistiam, dentro de um mesmo Reino, dois direitos diferentes, válidos de acordo com a origem das pessoas dentro do Reino. Em geral, se havia um conflito jurídico entre um bárbaro e um romano, a questão era julgada à luz do direito do réu. Já as mulheres estavam submetidas ao direito de seus pais ou maridos.

Nesse cenário, todas as questões e problemas propostos anteriormente podem ser utilizados para construir aventuras e campanhas, porque haverá tanto regulações romanas quanto bárbaras. Ademais, a origem de cada um dos personagens passa a ter uma importância ainda maior, na medida em que ela pode muito bem representar o quê o personagem pode ou não fazer dentro de cada região por onde passa.

Em tal situação seria bem possível permitir que um personagem pudesse ter conhecimento sobre os dois sistemas jurídicos vigentes no Reino, já que a convivência entre as duas culturas jurídicas se torna extremamente comum.

Eventualmente, porém, a dicotomia entre direito romano e direito bárbaro desaparece. Conforme os novos reinos bárbaros se consolidam e expandem, as concepções jurídicas romanas vão paulatinamente se mesclando às noções bárbaras, e os Reis dão início a uma nova forma de legislação – amparadas na compilação em textos das leis e regras de suas sociedades bárbaras.

A “personalidade” do direito desaparece, na medida em que as novas leis escritas por ordem dos Reis passam a valer para todos os habitantes do Reino. Em tal circunstância, os personagens se veriam em uma situação parecida com a descrita no primeiro dos artigos, ainda que bem menos complexa. Haveria leis e regras válidas, impostas pelo Estado – mas tais regras seriam simples, esparsas e bem menos presentes que aquelas que existiam no Império.

Sugere-se, por fim, uma espécie de aventura diferente. Nessa última situação, o grupo de aventureiros poderia ser “convocado” ou “contratado” por um Rei para vagar pelo país e recolher os costumes jurídicos das diferentes regiões controladas pelo Estado. O Rei pretende consolidar as leis de seu povo em uma lei escrita, mas precisa que os personagens juntem, chequem e se certifiquem de que nenhum costume importante fique de fora. Tal tipo de aventura teria amplo espaço e oportunidade para intrigas políticas, interações sociais e problemas jurídicos em geral, na medida em que entidades políticas e grupos de interesse desejariam influenciar os personagens de modo que suas leis e costumes fossem levados em consideração, e, os de seus rivais e inimigos, não.